Aos quinze anos começou a escrever poesias e, seis anos mais tarde, recebeu um dos prêmios literários mais importantes da Itália: o Viareggio Repaci, pela publicação do livro In cerca del mistero.
Em 1961 sua vida toma novos rumos, ao receber o convite de Pier Paolo Pasolini para integrar-se à filmagem de Accatone. A relação de trabalho e de amizade foi intensa e, em 1962, Bertolucci dirigiu, junto a Pasolini, La commare secca (no Brasil, A Morte). Os dois filmes são inspirados em elementos neorrealistas: filmagem em locações, ação no presente, atores não profissionais ou estreantes e histórias de personagens marginais.
Bertolucci e Pasolini faziam parte do Partido Comunista Italiano, a organização de esquerda com maior presença na democracia ocidental da época.
A evolução de Bertolucci foi rápida. Il Conformista (O Conformista), de 1970, permitiu ao diretor construir um conjunto de personagens presos a suas convicções políticas e a um universo onde a moral se torna relativa.
Dois anos mais tarde, assombrou o mundo com Ultimo Tango A Parigi (O Último Tango em Paris), celebrado como a obra que transformaria a maneira de filmar as relações sexuais. A poderosa atuação de Marlon Brando e a repercussão do filme permitiram que Bertolucci desse um salto qualitativo em seus projetos.
Novecento (1900), de 1976, é um dos filmes mais ambiciosos – em termos de produção e estética – do cinema da época. Destaca-se pela participação de duas jovens estrelas de diferentes nacionalidades: Robert de Niro e Gerard Depardieu. Também apresenta um espírito lírico e épico e provocou uma disputa exacerbada entre os produtores e o cineasta, em torno da duração do filme, o que levou a versão comercial do filme a ser quase incompreensível.
Em L'Ultimo Imperatore (O Último Imperador), de 1987, alcançou seu melhor relato político e Piccolo Buddha (O Pequeno Buda), em 1993, foi sua última grande produção.
Nas últimas duas décadas, optou por um tom intimista e cotidiano, mas seus personagens permaneceram vinculados a contradições políticas e sexuais. Impregna sua obra com uma atitude crítica em relação aos problemas sociais, econômicos e políticos, construída através de uma linguagem poética que transcende certos códigos consagrados e habituais do cinema.
O cinema de Bertolucci é considerado como um cinema “de classe” pela maior parte da crítica, pela inserção de uma realidade correspondente à do próprio autor. É uma obra que se realiza desde - e sobre - a burguesia, mas também para - e contra - a burguesia, segundo o crítico J. E. Monterde.
Sua filmografia se caracteriza pela ambição de abordar múltiplos aspectos de cada tema, a partir de uma visão totalizadora sobre os temas tratados. No principio de sua carreira como diretor, não foram o comunismo, o fascismo ou o antifascismo os alvos de sua crítica, em filmes como Prima Della Rivoluzione (Antes da Revolução), de 1964, Il Conformista, de 1970 ou Strategia Del Ragno (A Estratégia da Aranha), também de 1970.
Seus alvos foram os fracassos, a atitude de compromisso incerto e de sonhos não cumpridos, procedentes do mesmo tipo social: o jovem burguês protegido que, em um impulso de generosidade, em um acesso de lirismo ou pelo simples peso de sua condição, é arrastado para uma ação política que é incapaz de assumir.
Em contraponto, explora a vergonha, a renúncia, os abandonos e as traições, temas relevantes e a tendência a compor personagens que se conectam com a tradição do pensamento marxista do século XX.
A obra de Bertolucci, também, é marcada pela persistência na utilização do recurso do mito como mediador entre a sua intenção e o imaginário coletivo. Este aspecto é evidente, especialmente, nos três primeiros filmes, nos quais se revela a pretensão de integrar o pessoal, o específico e o concreto com o coletivo, o geral e o abstrato.
Baseado na novela homônima de Alberto Moravia, o filme remete ao mito do fascismo como doença da burguesia, consequente com seu processo de decadência. É estruturado em torno do plano de assassinato de Quadri, um exilado político italiano, a partir do qual se articulam diversos flashbacks que contribuem para ampliar o contexto biográfico do protagonista.
Trata-se de um personagem que traz consigo uma importante carga psicológica, projetada à infância e que oscila entre a sexualidade e o fascismo, levando-o a um desejo constante de integração em uma normalidade que é fruto da instabilidade produzida por seu conflito interno.
Seu casamento com uma pequeno-burguesa, a rejeição de uma maternidade desnaturalizada, o referência do anticlericalismo retorico, a dupla moralidade característica da hipocrisia tradicional dessa classe, são alguns dos aspectos que Bertolucci introduz como representação das aspirações do protagonista para alcançar a “ordem” como suposta solução para todos os problemas.
O filme deixa entrever, de certa forma, o momento político e psicológico de seu realizador. Bertolucci, que parte do argumento de um conto de Jorge Luis Borges, reconhece que as configurações paternas são uma de suas maiores preocupações, enfrentando o Édipo, assim como Athos Magnani ao buscar aprofundar a investigação sobre como ocorreu a morte do pai.
A Estratégia da Aranha se baseia no enfrentamento de gerações, inclusive político, entre um pai morto heroicamente lutando contra o fascismo e o filho, que tenta reconstruir sua memória. A história apresenta as intrigas da memória popular que se ocultam na espessura dos cenários e uma relação entre mito e história, evidente desde o momento em que é apresentado ao povo de Tara: ali a vida parece haver parado ou entrado em uma espécie de letargia.
No filme, a identidade é o pilar sobre o qual se articulam todos os temas. Bertolucci define uma situação na qual os protagonistas iniciam uma relação carente de identidade; é uma relação apenas sexual, cimentada, de certa forma, em seu próprio passado.
A relação impossível do casal evidencia a crise do indivíduo e da sociedade em que se desenvolve. Colocou em cheque as consciências puritanas de vários países, inclusive no Brasil, entre 1972 e 1980.
Eu e Você estabelece uma dialética entre o dentro e o fora, o lugar de recolhimento, longe da vida cotidiana, de Lorenzo, e as experiências de Olívia, em uma intimidade que vai avançando, ainda que os dois estejam em estágios diferentes. No descobrimento dessa afinidade imprevista, que veicula o arquétipo do encontro de contrários em um local fechado, Lorenzo se nega a abrir-se para a vida, enquanto Olívia já viveu muito.