É um poeta que o Brasil pouco conhece. Difundido, conhecido e cultuado nos países de fala hispânica, sua poesia vai além das impressões de uma língua e de costumes que possam ser demarcados por fronteiras culturais, porque é o inventário da vida de um homem simples, de gesto e voz terna, semelhante a todos os homens, que fala do amor e da vida – que são os mesmos, em qualquer parte do mundo, para qualquer alma humana, em qualquer tempo e em qualquer lugar.
Transitou pelos mais variados gêneros literários: romances, contos, poesias, ensaios, pertencendo a uma geração que brindou ao mundo escritores únicos, poetas grandiosos como Julio Cortázar e Juan Gelman (para citar apenas dois nomes).
Os anos marcaram em seu rosto os sinais da poesia, mas seu olhar, mais do que qualquer coisa, sempre contou muito mais histórias do que aquelas que escreveu, sempre foi um verso a mais, ainda não escrito, impossível de traduzir.
Quando sua alma se dispôs a transformar-se em palavra, percorreu todas as sendas da condição humana: o amor, a saudade, a morte, o tempo, a desventura, a injustiça, a solidão e a esperança. Tudo isso fez de forma tão simples, tão direta, tão humana, que é impossível ler uma única linha de Benedetti sem um sentimento de cumplicidade.
A inclusão dos temas sociais, sem descuidar do amor, das referências familiares, do tempo e da memória, foi criando formas de fino humor e ironia, articulando a crítica social e a necessidade de testemunhar a própria existência.
Seu estilo sustenta uma visão sobre a poesia que a desmistifica, longe do intelectualismo programático, ressaltando a beleza da simplicidade, da linguagem direta e clara e da enorme carga de significado que comporta cada palavra.
A poesia, em Benedetti, se torna um elemento vital, marcado pela humildade de quem define a si mesmo como o “desmancha-prazeres da poesia”, um “poeta menor” cuja única pretensão foi escrever o que sentia.
Contudo, sua poesia personificou-se como arma social, que insistente e constantemente ergue a voz que ninguém quer escutar, até que se faça ouvir como a voz de uma consciência que se impõe a todos porque, desde o princípio, se impôs àquele que a transmite.
Evoluindo para uma arte poética cada vez mais concreta, companheiro da palavra, Benedetti personaliza o conceito da poesia. Palavras obscuras, graves, propõem libertar a linguagem de referências obrigatórias, de termos estáticos, convertendo-a em algo expressivo, transformador, de uma beleza cotidiana e útil.
Na medida em que se enriqueceu de conteúdos e referências, sua poesia foi adquirindo elementos mais intimistas: a poesia como uma forma de crescer, de compreender e de sentir, de sobreviver - uma forma vital da verdade, surgida como o legítimo sentido da sua própria vida.
Benedetti foi ainda além: resgatando intuições, incorporou também a negação da poesia (a poesia não é), assumida como generalização da realidade, como a única protagonista – como a liberdade, enfim.
A trajetória de sua poesia revela uma obra que procede de experiências de vida, da percepção transparente da realidade, de uma ternura ao mesmo tempo doce e rebelde.
É capaz de resumir a multiplicidade da existência em uma única palavra. Por isso, é um dos luminares das letras latino-americanas, um nome a ser lembrado, consagrado e cultuado por todos quantos sabem que a saudade, o amor e o prazer, cada pequeno sucesso ou fracasso cotidiano, quando traduzido pela pena de Benedetti, nos redime de nossa condição humana – e precisamente por isso, nos humaniza.