Nascido em Buenos Aires, em 3 de maio de 1930 e falecido em 14 de janeiro de 2014, publicou seu primeiro poema aos onze anos. Ainda na adolescência ingressou na Federação Juvenil Comunista da Argentina. Iniciou os estudos de Química na Universidade de Buenos Aires, mas abandonou o curso para dedicar-se ao jornalismo e à poesia.
Em 1995, junto a vários companheiros da juventude comunista, fundou o grupo de poesia El pan duro, para publicar livros de poesia através da venda antecipada e realização de recitais. A ideia do grupo era fazer política “com ares de tango”, mas também romper com a estética imposta como padrão para a poesia latino-americana. Dessa ideia desenvolveu-se sua linguagem coloquial, de temas cotidianos, a irreverência sintática, a liberdade no uso de diminutivos, na flexão verbal, na invenção de substantivos...
Da leveza inicial de sua obra sucedeu-se a etapa da militância política, os anos escuros da ditadura, o exílio forçado, o desaparecimento do filho e da nora, grávida de sete meses, a busca pela neta, encontrada somente em 2000.
Em 1973, quando publicou seu oitavo livro, Relaciones, o tom alegre de seus livros anteriores foi substituído por questionamentos que incentivam a reflexão, com frases mais curtas, fragmentadas, palavras sussurradas... Também em Hechos, de 1980, escreveu sobre a ditadura, a derrota, o exílio e a morte, em versos perpassados por uma dor profunda.
A partir do encontro da neta, sua poesia tornou-se mais serena, mas seus olhos tristes e sua voz suave permaneceram como marcas de mais de trinta anos em busca de notícias de sua família – marcas que ultrapassaram o homem e se inscreveram na obra, através da amargura e da ironia de quem, irremediavelmente, teve la confianza lastimada quanto à vida e quanto ao futuro, como ele próprio dizia.
Gelman sugere que não apenas se deve mudar a sociedade, o mundo e a poesia, mas que o poeta, o homem, precisa propor essa mudança a si mesmo. Nisso reside, talvez, a nova poesia latino-americana a partir dele: a poesia não nasce nos salões ou escritórios, não se reveste de oficialismos e intelectualidades, mas brota das trincheiras, das ruas, de estar face a face com o inimigo.
O novo poeta compartilha os dramas e as tragédias de milhões de outras pessoas, é apenas mais um nessa multidão. O conceito do poeta eleito pela divindade para falar pelo povo se dissolve em um indivíduo que sofre, que ama e que morre como todos os outros.
Nesse sentido, é quase impossível falar da poesia de Juan Gelman sem fazer referência, de alguma forma, à sua vida, porque foi um homem para quem vida e atividade criadora se fundiram, formando uma unidade inseparável.
Segundo Julio Cortázar, o mais admirável em sua poesia é “a ternura quase impensável quando se esperaria o arrebatamento, a revolta e a denúncia, é a invocação de tantas sombras a partir de uma voz que sossega e tranquiliza, uma permanente carícia de palavras sobre tumbas desconhecidas”.
Sua obra revela uma busca ambiciosa por uma linguagem transcendente e que aproxima a poesia às grandes questões de seu tempo, seja através do realismo crítico e do intimismo, seja pela abertura para o novo, pela singularidade de uma forma de ver o mundo que conjuga uma aventura verbal com o compromisso social e político:
A produção literária do poeta foi traduzida para quatorze idiomas e entre os últimos prêmios recebidos estão o Prêmio Nacional de Poesia (Argentina, 1997), o Prêmio Juan Rulfo de Literatura Latino-americana e do Caribe (México, 2000), o Prêmio Pablo Neruda (Chile, 2005), o Prêmio Reina Sofía de Poesia Ibero-americana e o Prêmio Cervantes (Espanha, 2005 e 2007, respectivamente).
Quem disse alguma vez: até aqui a sede,
até aqui a água?
Quem disse alguma vez: até aqui o ar,
até aqui o fogo?
Quem disse alguma vez: até aqui o amor,
até aqui o ódio?
Quem disse alguma vez: até aqui o homem,
até aqui não?
Só a esperança tem os joelhos nítidos.
Sangram.