com mentiras lançadas ao ar.
Pode me jogar contra o chão de terra,
mas ainda assim, como a poeira, eu vou me levantar”.
No prólogo do primeiro volume de sua autobiografia, dizia que “se crescer no sul é doloroso para uma menina negra, ser consciente de sua própria exclusão é como ter uma navalha no pescoço”.
Aclamada como poetisa, biógrafa, escritora, educadora, dramaturga, produtora, atriz, historiadora, cineasta, cantora e ativista de direitos civis, nasceu em 4 de abril de 1928, em Sant Louis, Missouri, e passou boa parte da infância na zona rural do Arkansas, onde conheceu a brutalidade da discriminação racial, mas também a indestrutível fé e os valores tradicionais da família, da comunidade e da cultura afro-americana.
Aos oito anos foi violentada pelo namorado de sua mãe. O homem foi espancado até a morte, o que causou-lhe tamanho trauma que não mais conseguia falar. Durante esse período, na escola, desenvolveu vocação para as letras, voltando a falar ao ser convencida pela professora que apenas poderia apreciar a leitura se fosse capaz de falar novamente.
Aos dezesseis, terminados os estudos secundários, deu à luz seu filho, Guy, e passou a trabalhar como cozinheira e camareira, mudando-se em 1940 para São Francisco, para viver com a mãe.
Na década de cinquenta iniciou carreira como cantora, bailarina, atriz, poetisa, escritora, e ativista dos direitos civis. Esse ativismo político, iniciado no final dos anos cinquenta e início dos anos sessenta, ocorreu no mesmo momento dos seus primeiros êxitos como cantora e o ingresso no The Harlem Writers Guild, onde conheceu escritores como James Baldwin, que se tornou seu mentor.
Apesar do sucesso profissional, sua vida se politizou a tal ponto, em uma época particularmente convulsa da história dos Estados Unidos, que decidiu abandonar todas as outras faces de sua vocação artística para dedicar-se ao ativismo.
Em virtude de suas atividades políticas, conheceu Martin Luther King e Malcolm X, cuja forma de abordar a luta racial aproximava-se da sua, especialmente num momento em que, pessoalmente, enfrentava problemas com a direção da escola de seu filho em virtude do ódio racial.
Após ouvir um discurso de Martin Luther King no The Harlem Writers Guild, produziu, junto a um colega músico, a revista musical Cabaré da Liberdade, apresentada no bairro Greenwich Village de Nova Iorque, assumindo uma posição de liderança na Southern Christian Leadership Conference – SCLC.
Ao decidir colaborar com a SCLC, onde precisou superar seus próprios preconceitos raciais, uniu-se também a colaboradores brancos, como Jack Murray. Esforçando-se para harmonizar seu ativismo político com as responsabilidades como mãe, foi obrigada a enfrentar o líder de uma gang de jovens negros, os Savages, que ameaçavam seu filho, sem conseguir evitar sentir simpatia por estes.
Quando conheceu o sul-africano Vusumzi Make, representante do congresso pan-africano, deixou seu trabalho como coordenadora da SCLC e como co-fundadora da The Cultural Association for Women of African Heritage – CAWAH -, assumindo um papel de dona de casa, como Make esperava que fosse.
Por encontrar-se em graves dificuldades econômicas, por culpa de Make, Maya viajou para o Egito com a família, buscando iniciar uma nova vida e esquecer a marginalização anteriormente vivida. Apesar dos preconceitos contra as mulheres, conseguiu trabalho como jornalista no The Arab Observer.
As infidelidades de Make e a hostilidade que encontrou no local de trabalho, especialmente, levaram-na a mudar-se para a África Ocidental e matricular o filho na Universidade de Gana. Considerando que a África seria o único lugar no mundo onde poderia libertar-se definitivamente do estigma da negritude, exilou-se voluntariamente. Seu questionamento da marginalização e da discriminação racial a levou a explorar um novo terreno – o da dicotomia entre o centro e a periferia -, onde encontrou conexões inesperadas.
Ao chegar a Gana, um país que acabava de se tornar independente, então presidido por Kwame Nkrumah, Maya e o filho foram surpreendidos ao ver pilotos negros (algo impensável nos Estados Unidos, em 1962) e ao testemunharem como os negros assumiam com eficiência todas as posições de liderança. Iniciou-se, assim, uma etapa que parecia promissora em sua vida, mas um grave acidente ocorrido com Guy fez com que Maya passasse a temer por sua vida e a obrigou a modificar seus planos.
Explorando diversas zonas de Gana, observou semelhanças entre a hospitalidade da qual era objeto e a solidariedade entre os vizinhos que testemunhara no sul dos Estados Unidos durante a infância. As diferenças culturais com os nativos de Gana eram marcadas, especialmente, pelo espírito de luta da minoria negra norte-americana, que sofreu a tragédia da escravidão e do racismo e, em virtude dessa percepção, concluiu que os afro-americanos “não podem voltar” para a África.
Decidiu então retornar aos Estados Unidos, mas, antes de partir, em 1965, visitou a zona de Keta, que foi muito castigada pelo fenômeno da escravidão. Percebendo detalhes que lhe pareceram estranhamente familiares, uma mulher a “reconheceu” no mercado e iniciou uma cerimônia pelos familiares perdidos. Convencida de que efetivamente eram parentes, Maya se uniu ao seu pranto.
Essa experiência e as demais, vividas na África, marcam-na profundamente e fizeram com que amadurecesse a escritora, que aprendeu, entre outras coisas, que uma atitude permanentemente belicista não poderia levar ao alcance do modelo de sociedade com o qual sonhava.
Em sua volta aos Estados Unidos passou a colaborar com Malcolm X na Organization of Afro American Unity – OAAU -, um projeto que não chegou a converter-se em realidade, em razão do assassinato de Malcolm X. Esse fato e, em 1968, o assassinato do amigo Martin Luther King, foram devastadores para ela.
Como escritora, sua obra mais famosa é a série autobiográfica que inicia com I Know Why the Caged Bird Sings, de 1970. Em quase todos os seus escritos denuncia o racismo e exalta o valor da perseverança, da sobrevivência e da autoestima.
Maya Angelou introduziu uma diversidade maior na representação da mulher negra, especialmente pela sua representação com matriarca hábil e poderosa, o que contribuiu para superar preconceitos raciais e sexistas. Sua própria vida e sua mobilidade constituem, nesse sentido, uma nova característica em uma mulher negra, tradicionalmente restrita a um espaço limitado em razão da sua raça e das funções sociais determinadas pelo fato de ser mulher.
Transformou, através do gênero da autobiografia, uma experiência privada e única em algo coletivo e universal. Abandonou a marginalidade para estabelecer-se como protagonista de sua tradição literária.
Sua determinação ao superar tanto o exílio interno ao qual a condenou o sistema ideológico da segregação como o exílio externo que a levou a Gana, a converteram em um ícone da comunidade afro-americana. Sua primeira obra vendeu mais de um milhão de exemplares em todo o mundo, além de inspirar uma versão para o cinema.
Em I Know Why the Caged Bird Sings, aclamada pela crítica, narra sua infância ao lado da avó puritana, a relação complicada com sua mãe e a gravidez na adolescência.
The Heart of a Woman, de 1981, narra sua experiência como ativista política nas décadas de cinquenta e sessenta.
All God´s Children Should Have Travelling Shoes, de 1986, fala das decepções pela falta de resultados na luta pelos direitos civis e por sua própria relação sentimental, a ida para a África e o exílio voluntário.
É também autora do roteiro e da música do filme Georgia, Georgia (1972), de Stig Björkman e, posteriormente, transformou-se na primeira mulher negra a dirigir um filme em Hollywood.
No funeral do ator e ativista Ossie Davis, em 2005, Maya Angelou pronunciou um discurso cujas palavras também servem para honrá-la: