Sua primeira coleção, “É para isso que vivemos", de 1952, foi escrita sob o regime comunista da Polônia e é uma expressão do realismo socialista.
Durante a vida, escreveu cerca de quatrocentos poemas aparentemente simples, mas sutis e profundos. Utilizou-se de imagens do cotidiano - uma cebola, um gato... - para refletir verdades maiores, tratando dos grandes temas da vida: o amor, a morte e a passagem do tempo.
Na data em que se recorda os três anos de seu falecimento, é preciso render as justas homenagens à mulher que é descrita como sendo um "Mozart da poesia", pela força e a profundidade com que suas palavras nos alcançam.
Influenciada pela obra do poeta Czeslaw Milosz, iniciou sua carreira literária consagrada essencialmente à poesia, embora também tenha escrito críticas e ensaios em diversas publicações, como "Walce", "Pokoleniu", "Naprzód" e "Świetlica Krakowska".
Em 1945 publicou no jornal Dziennik Polski o seu primeiro poema, Szukam słowa (Busco a palavra), mas apenas em 1952, com Dlatego żyjemy (É por isso que vivemos) e posteriormente, com Pytania zadawane sobie (Perguntas feitas a mim mesma), em 1954, alcançaria o reconhecimento literário.
Filiada ao Partido Unificado dos Trabalhadores da Polônia, seus primeiros poemas se enquadram dentro do realismo socialista, estilo que abandonaria a partir de 1957, com a publicação de Wołanie do Yeti (Chamada ao Yeti), livro no qual faz uma reflexão pessoal, intimista e condenatória do período estalinista. Na época, trabalhava como editora de poesia e colunista do jornal Życie Literackie, ao mesmo tempo em que publicava ensaios e artigos e traduzia poemas franceses para o polonês.
Em seguida, publicou Sól (Sal), Sto pociech (Cem Consolos), Wszelki wypadek (Poderia ser), Wielka liczba (Grande número), Ludzie na moście (As pessoas na ponte) e Koniec i początek (Fim e princípio). Em todas essas obras, muitas não publicadas no Brasil, ressalta-se seu estilo intimista, irônico, paisagístico e existencialista.
Pelo conjunto de sua obra poética, não numerosa, mas memorável, recebeu o Prêmio Nobel de Literatura em 1996. No discurso feito ao recebê-lo - um dos mais breves e irônico da história desse prêmio -, Szymborska disse que qualquer saber que não provoca novas perguntas se converte imediatamente em algo morto, perde a temperatura que lhe proporciona a vida. Também falou das duas palavras que sempre a estimularam: “não sei”.
Em suas últimas obras publicadas aprofundou seu olhar filosófico sobre a vida, sem deixar de utilizar-se de um humor mordaz: Chwila (Instante); Tutaj (Aqui), Dwukropek (Dois pontos) e Wystarczy (Apenas) são obras nas quais se mantém fiel, até com certo sarcasmo, à pretendida salvação pela palavra.
Porém, nunca demonstrou a intenção de ter a última palavra em nada do que escreveu, porque sempre soube que a salvação reside em cada uma das palavras ditas e em cada olhar lançado sobre elas e, ao mesmo tempo, que a salvação é apenas uma das perguntas para as quais é impossível encontrar respostas.
Me desculpe o acaso por chamá-lo necessidade.
Me desculpe a necessidade se ainda me engano.
Que a felicidade não se ofenda por tomá-la como minha.
Que os mortos me perdoem por luzirem fracamente na memória.
Me desculpe o tempo pelo tanto de mundo ignorado por segundo.
Me desculpe o amor antigo por sentir o novo como primeiro.
Me perdoem, guerras distantes, por trazer flores para casa.
Me perdoem, feridas abertas, por espetar o dedo.
Me desculpem os que clamam das profundezas pelo disco de minuetos.
Me desculpe a gente nas estações pelo sono das cinco da manhã.
Sinto muito, esperança açulada, se às vezes me rio.
Sinto muito, desertos, se não lhes levo uma colher de água.
E você, falcão, há anos o mesmo, na mesma gaiola,
fitando sem movimento sempre o mesmo ponto,
me absolva, mesmo se você for um pássaro empalhado.
Me desculpe a árvore cortada pelas quatro pernas da mesa.
Me desculpem as grandes perguntas pelas respostas pequenas.
Verdade, não me dê excessiva atenção.
Seriedade, me mostre magnanimidade.
Ature, segredo do ser, se eu puxo os fios de suas vestes.
Não me acuse, alma, por tê-la raramente.
Me desculpe tudo, por não poder estar em toda parte.
Me desculpem todos, por não saber ser cada um e cada uma.
Sei que, enquanto viver, nada me justifica
já que barro o caminho para mim mesma.
Não me julgue má, fala, por tomar emprestado palavras patéticas
e depois me esforçar para fazê-las parecer leves.
(Do livro Poemas. Tradução de Regina Przybycien. São Paulo: Companhia das Letras, 2011)