Em uma entrevista, Lampião disse que, por não confiar na ação da justiça, porque os assassinos contavam com a escandalosa proteção dos “grandes”, resolveu fazer justiça com as próprias mãos, vingando a morte do pai.
Em 1922, aos vinte e sete anos, formou seu próprio bando. No mesmo ano atacou a fazenda da Baronesa de Água Branca e continuou seus combates em Serra Grande, Sergipe, Queimadas e sertão adentro.
Em 1929 conheceu Maria Gomes de Oliveira, Maria Bonita, com dezenove anos de idade, sua companheira de vida e a grande responsável pela humanização da figura de seu Capitão e da própria vida no cangaço.
Antes dele, no cangaço não havia música e a diversão era pouca. Pode-se afirmar, inclusive, que não havia o sentido social do cangaço, mas apenas grupos de bandidos espalhados pelo sertão.
Por quase três décadas, entre os anos vinte e trinta, vagando por sete estados, Lampião semeou o terror e a morte, mas também ganhou a admiração de um herói para o povo sofrido do sertão. Para uns era um deus salvador e, para outros, o próprio diabo. Admirado por sua valentia, a lenda do Rei do Cangaço foi alimentada pelo fracasso de todas as operações preparadas para capturá-lo e as recompensas oferecidas para quem o assassinasse também contribuíram para aumentar a sua fama.
O mito de Lampião alcançou todo o país e ultrapassou fronteiras. Em 1931, o The New York Times chegou a apresentá-lo como o “Robin Hood da caatinga”, que roubava dos ricos para dar aos pobres. Era tão vaidoso que usava perfumes franceses e distribuía cartões de visita com sua fotografia. Também apreciava entrar nos povoados jogando moedas e seu prestígio era tal que o Padre Cícero intermediou negociações entre o governo e Lampião, em 1926, para que seu bando auxiliasse no combate à Coluna Prestes. Chegou a ser nomeado capitão do exército e recebeu do governo armas e uniformes.
Em 1938, em uma incursão ao agreste alagoano, o bando escondeu-se na Gruta do Angico, em Sergipe. A polícia alagoana, informada do esconderijo, organizou uma emboscada. Às quatro horas da manhã do dia 28 de julho, em poucos minutos, Lampião, Maria Bonita e outros dez cangaceiros foram decapitados. Suas cabeças foram exibidas de forma macabra, com o objetivo de evitar a formação de novos bandos, o que de certa forma foi alcançado, pois com Lampião morreu também o cangaço.
O Rei do Cangaço foi, em uma época e uma região extraordinária, na qual os cangaceiros eram demonizados pela imprensa como bandidos cruéis e idolatrados pelo povo oprimido e miserável como benfeitores dos pobres, um mito brasileiro.
Extremamente católicos, o bando de Lampião também era formado por homens e mulheres amantes da música, dos perfumes, de joias e boas roupas.. Conviviam em um eterno conflito com os coronéis latifundiários, com os milagreiros e beatos, com os matadores de cangaceiros, com as forças policiais sanguinárias e corruptas.
Envolvido com o bando, chegou a escrever: “é uma beleza esse bando de Lampião; sua independência de ação tem a nobreza dos grandes guerreiros. Não são assalariados do crime. Matar, para eles, é uma questão de honra nesta terra de injustiças”.
No momento da estreia de seu documentário – Lampião, o rei do cangaço -, dois meses antes da morte de Lampião, no clímax da repressão contra o cangaço, Abrahão foi assassinado em misteriosas circunstâncias, com quarenta e duas punhaladas. O filme foi confiscado e grande parte perdeu-se em virtude da umidade em algum arquivo policial.
Outros poucos reconstruíram suas vidas com novas identidades, como Durvinha e Moreno, que ocultaram suas identidades até mesmo dos filhos, que acreditavam que seus nomes fossem Jovina Maria da Conceição e José Antonio Souto.
Dadá faleceu em 1994 e, apesar da insistência de jornalistas e estudiosos, jamais revelou seus segredos, encerrando todas as tentativas com uma única frase: “A gente não cospe no prato de quem nos deu comida”.
A literatura e, especialmente, o cinema encarregaram-se de manter viva a memória do cangaço e de Lampião. Dezenas de produções escritas e audiovisuais foram produzidas sobre o tema, a história, o mito e a realidade desses personagens.
O filme O Cangaceiro, de Lima Barreto, premiado no Festival de Cannes, em 1953, contribuiu para levar o cinema brasileiro e essa memória ao panorama internacional.